quarta-feira, 20 de abril de 2011

ERA UMA VEZ UMA BENZEDEIRA NA FAMÍLIA...






       
                 Hoje me lembrei de quando era criança na Tabajaras e minha mãe mandava que eu levasse algum de meus irmãos menores na benzedeira. Uma era D. Maria de Sr. Olavo e a outra, D. Zilda, que plantava verduras e morava perto do escadão. Eu ia entre curiosa e medrosa, pois meu pai odiava essas crendices, enquanto a minha mãe e minha avó acreditavam e confiavam.
            Era uma casa simples onde a mulher que rezava  ficava com um lenço amarrado na cabeça e galhos de folhas nas mãos e, às vezes, brasas vermelhas perto de uma vasilha d´água que se transformariam em carvão. Eu com o olhar assustado não perdia um só de seus movimentos, que subiam e desciam com as ervas e as rezas.
            Era uma cultura naquela época. Minha avó acreditava piamente, ela também sabia fazer as rezas, porque muitas vezes quando faltava encontrar alguma benzedeira ela mesma rezava.
             E sabemos que no Brasil, ainda nas pequenas cidades do interior, muitas senhoras ainda difundem o poder de “antigas benzeções”  aliadas a uma variedade de ervas e unguentos. 
          São benzeduras para afastar o olho gordo, a inveja, a desenteria, o vômito, o quebranto, o torcicolo etc. As folhas eram colhidas no quintal da casa: arruda, erva de são jorge, assapeixe, galho de peão-roxo ou de vassourinha, que expurgam as enfermidades do corpo humano e os mal-olhares.
            O ritual era vela acesa, água num copo de vidro transparente, brasas ardentes e as folhas.  Era um tal de fazer sinal da cruz nos pés da criança, na testa, rezava -se "3 padre-nosso e 3 ave-maria" virando-a de bruços,. Depois tomava-lhe os pés bem juntinhos,  sacudia e fazia o nome do Padre e rezava assim: Deus qui te feis,/ Deus qui ti criou,/ Nossa Senhora é qui tira /esse mal qui ti introu.// E rezava um padre-nosso e uma ave-maria, batendo com os ramos das folhas. “ Pois assim que os ramos murchassem, absorviam a doença e  a pessoa sarava, segundo a crença.
                 Não sei como andam as benzedeiras em nossos dias, mas na minha época de criança era bastante comum procurá-las. Minha avó tinha uma fé inabalável nestas coisas. Certa vez ela e minha mãe mandaram que eu levasse Armindinho na casa de dona Maria de Sr. Olavo, meu pai chegou e me encontrou no caminho com meu irmão. Chegando em casa foi o maior quebra-pau porque ele não gostava e isso já era tardinha, pois levar alguém a uma benzedeira tinha que ser ao raiar do sol ou ao crepúsculo, "noitinha".
            Os rituais eram  revestido de tradição, mistérios, símbolos sagrados,  rezas, rosários, sal,  água benta, cordão e ervas, de  origem africana, indígena e européia.  Benzer era um fio invisível e poderoso unindo as dores dos homens e suas mazelas ao Criador. 
            Em meio à sabedoria popular e tradicional,  ainda existem algumas mulheres portadoras desta dedicação e tradição, que nas rugas dos rostos e na calma de suas rezas fazem esforços para curar os males físicos e espirituais do corpo e da alma humana.


Vera da Mata
VC, 20/04/2011